
Bebês com baixo peso e altos custos com
internamento estão entre os efeitos da taxa crescente de crianças
nascidas antes da hora no Brasil
Enquanto
a taxa de natalidade cai ano a ano, a proporção de bebês nascidos antes
da hora só aumenta no Brasil. De 2001 a 2010, o número absoluto de
nascimentos teve queda de 8,2%, passando de 3,1 milhões para 2,8
milhões. No mesmo período, o porcentual de prematuros foi de 6,3% para
7,1% do total – o equivalente a quase 205 mil bebês em 2010, na sua
maioria com baixo peso e outras complicações. Além dos problemas de
saúde que obrigam as crianças a ficar meses internadas, as famílias
enfrentam o desgaste emocional e os altos custos dos tratamentos.
O
Ministério da Saúde não tem dados de quanto custa tratar um bebê
prematuro, mas informa que paga ao menos R$ 478,72 por uma diária em
UTI. Esse valor pode ser multiplicado por quase dez se forem computados
outros gastos, como medicamentos e alimentação especial. Segundo
maternidades de Curitiba, uma diária pode chegar a R$ 4 mil, dependendo
do grau de comprometimento do recém-nascido.
De acordo com o Ministério da Saúde, não existem no Brasil estudos
que determinem as causas para o crescimento da prematuridade. Mas
fatores como a preferência pela cesariana, o crescimento das gestações
múltiplas e o adiamento da maternidade estão entre as possíveis
explicações.
O Brasil tem uma das maiores taxas de cesáreas do mundo. 45% dos
partos são cirúrgicos, enquanto a Organização Mundial da Saúde
estabelece o limite de 15%. O quadro piora quando se considera gestantes
com melhores condições financeiras: entre as que têm plano de saúde, a
proporção de cesarianas sobe para 90%. “Quando é programada com semanas
de antecedência, a cesariana pode aumentar a chance de nascimento
prematuro. Há casos de indicação médica para esse tipo de procedimento,
mas nos demais o ideal é o parto normal, que desencadeia uma série de
alterações hormonais necessárias à preparação da criança para o parto”,
explica o médico Nelson Arns, doutor em Saúde Pública.
Gestações múltiplas
O porcentual de gestações múltiplas cresceu 17% no país em sete anos. Segundo a Pesquisa Registro Civil
2010, do IBGE, a proporção de brasileiros nascidos nesse tipo de parto
passou de 1,59% para 1,86% do total entre 2003 e 2010, o que significa
que apenas em 2010 nasceram cerca de 50 mil gêmeos, trigêmeos e
quadrigêmeos (3 mil no Paraná).
A ginecologista Francieli Maria Vigo, pós-graduanda em Reprodução
pela Universidade Federal de São Paulo, diz que as chances de parto
prematuro são três ou quatro vezes maiores em gestações múltiplas.
“Depende do número de fetos e das condições de saúde da mãe. Quanto mais
bebês e quanto mais delicado o quadro da mãe, maiores as chances de
parto prematuro.”
Nelson Arns, coordenador nacional da Pastoral da Criança, destaca
também a idade materna como outro fator importante. “Um estudo feito na
Dinamarca comprovou que o risco de parto prematuro é maior entre mães
muito jovens e entre as que optam por ter filho mais tarde.”
Para ele, no caso das mães mais jovens pesa o fator econômico.
“Geralmente meninas pobres têm filhos antes da hora. Elas não têm acesso
ao pré-natal de qualidade e não previnem ou tratam doenças, como a
infecção urinária, que antecipam o nascimento do bebê.” Com relação às
mães mais maduras, ele acha que elas precisariam ser devidamente
informadas que estão mais sujeitas ao parto prematuro e a todas as
consequências dessa escolha.
Nelson Arns alerta ainda para o fato de muitas mulheres deixarem de
fazer exames de sangue durante a gestação, mas não abrirem mão da
ecografia. “No Brasil se faz mais ecografia do que exame de sangue. Esse
comportamento precisa mudar, pois a primeira serve apenas para
satisfazer uma curiosidade sobre o sexo do bebê, enquanto os exames de
sangue podem identificar e ajudar no tratamento de várias doenças.”
Boom de gestação de gêmeos pode ser freado no país
A preocupação com o avanço das gestações múltiplas é mundial. E como
há a associação direta entre o maior número de partos gemelares e as
técnicas de reprodução assistida, alguns países estabeleceram regras
rígidas para os processos de fertilização in vitro.
É o caso da Finlândia, que só faz o implante de um embrião por
procedimento. Lá os tratamentos são patrocinados pelo governo, que
prefere pagar os custos de várias tentativas para uma mulher engravidar
do que arcar com os efeitos indesejados de gestações múltiplas,
especialmente o nascimento de prematuros.
“No Brasil não temos mais do que cinco centros públicos de reprodução
assistida. Eles não respondem nem por 5% dos procedimentos realizados
todos os anos, que giram na casa dos 50 ou 60 mil. E como os custos são
altos – uma fertilização in vitro pode chegar a R$ 18 mil –, os casais
buscam maiores chances de sucesso e optam pela implantação de mais de um
embrião”, explica o presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução
Assistida, Adelino Amaral.
Mas aqui as regras também estão se tornando mais rígidas e há a
expectativa de que nos próximos anos o país reverta a tendência de
elevação das gestações múltiplas, como reflexo da resolução 1.957/2010,
do Conselho Federal de Medicina (CFM). Ela limita o número de embriões
implantados por procedimento: dois para mulheres com menos de 35 anos;
três, para quem tem até 40 anos; e no máximo quatro para quem é mais
velha. Antes da mudança, mulheres com qualquer idade podiam receber até
quatro embriões.
Múltiplos
Os números do IBGE mostram que o crescimento nas gestações múltiplas
se concentra nos casos de gêmeos. Mas, mesmo sendo possível para
mulheres de qualquer idade implantar ao menos dois embriões, o médico
Renato Fraietta, coordenador do Centro de Reprodução Assistida da
Universidade Federal de São Paulo, diz que a resolução do CFM vai
impactar nas gestações de gêmeos. “Quando implantamos quatro embriões,
dificilmente todos se desenvolvem. Agora, com dois embriões, ainda
teremos gêmeos, mas será mais comum o desenvolvimento de apenas um
bebê.”
Já há relatos de queda nos casos de gestações gemelares, pois, antes
mesmo da resolução do CFM, os médicos sentiram a necessidade de reduzir o
número de embriões implantados. “O médico tem conhecimento de todas as
complicações dos partos múltiplos e o dever de orientar o casal. É
bonito ver dois, três ou até quatro bebês juntos, mas há muitas
implicações que precisam ser consideradas”, diz o obstetra Hélcio
Bertozzi Soares, da Câmara Técnica de Reprodução Assistida do Conselho
Regional de Medicina.
Fonte: http://www.gazetadopovo.com.br/vidaecidadania/conteudo.phtml?tl=1&id=1246951&tit=A-vida-secreta-das-maes-de-UTIs