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terça-feira, 29 de setembro de 2015

O Milagre da 28ª Semana


Kelly de Moraes Grolla e Fernando Luso Barreiros Neto: "Tive medo de machucá-los"
Kelly de Moraes Grolla e Fernando Luso Barreiros Neto:
 "Tive medo de machucá-los"(Paulo Vitale/VEJA)
O parto chega ao fim. A mãe ainda não pode acolher o filho nos braços. O bebê é carinhosamente levado para um canto da sala e cercado por médicos que o examinam velozmente. Os profissionais registram uma queda brusca de temperatura no organismo da criança. A pele fininha, com vasos quase expostos, e a escassa gordura do corpo não armazenam o calor a contento. O processo tem de ser drasticamente interrompido. O bebê é envolto em um saco de plástico fino, feito de polietileno, para frear a perda calórica. Incapaz de respirar sozinho, recebe suporte de oxigênio por meio de uma cânula que entra na boca, passa pela garganta e vai até os pulmões. Ele é acomodado sobre um colchão térmico. A cabecinha é protegida com uma touca de lã. A mãe o vê sair. Ele é levado para a UTI do hospital, onde permanecerá por no mínimo dois meses, tempo necessário para que os órgãos amadureçam e se fortaleçam com a ajuda de aparelhos. O sistema digestivo do corpinho frágil não consegue digerir alimentos, tampouco o leite materno é aceito com naturalidade. As paredes das artérias do cérebro são tão finas que podem se romper a qualquer instante. Os rins têm pouca capacidade de filtrar o sangue.​


A evolução na taxa de sobrevivência sem sequelas dos chamados prematuros extremos, aqueles que precisam de mais cuidados ao nascer. Os pesos e as alturas representam uma média - Fonte: Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos
A evolução na taxa de sobrevivência sem sequelas dos chamados prematuros extremos, aqueles que precisam de mais cuidados ao nascer. Os pesos e as alturas representam uma média - Fonte: Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos(VEJA.com/VEJA)

​Assim correm os primeiros minutos da vida de um bebê nascido com 28 semanas de gravidez, apenas 1 quilo e 29 centímetros de comprimento. Hoje, seis a cada dez crianças com medidas assim, tão diminutas, conseguem sobreviver sem nenhum tipo de sequela. "Houve espetacular avanço, um dos mais fascinantes da medicina", diz Suely Dornellas do Nascimento, pediatra neonatologista do Hospital Santa Joana, em São Paulo. Há duas décadas, apenas quatro venciam a dramática travessia inaugural. No patamar das 28 semanas deu-se o grande salto estatístico. Mesmo em bebês ainda mais prematuros, de 25 semanas, celebra-se alguma conquista - de 18% de sobreviventes sem danos posteriores, taxa registrada em 1997, saltou-se para 22% agora. Crescidos, esses bebês levarão vida igual à dos nascidos a termo, de 38 a 42 semanas, com 3 quilos e os órgãos completamente desenvolvidos. A animadora informação faz parte do maior estudo já realizado sobre a prematuridade, recém-publicado na revista científica The Journal of the American Medical Association (Jama). Conduzido pelos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos (NIH), o trabalho avaliou 35 000 bebês nascidos antes do tempo ao longo de dezenove anos. É um marco.
Extraordinárias inovações da medicina neonatal permitiram que vidas começassem mais cedo - como a criação do teste de Apgar (do nome da médica americana Virginia Apgar), que, em 1950, estabeleceu critérios para definir os sinais vitais de um recém-­nascido. Ela também propunha que outro médico cuidasse exclusivamente da saúde da criança. A presença de especialistas na sala de parto permitiu uma melhora na saúde do bebê ao nascer. Já mais recentemente, em 2011, autorizaram-se procedimentos cirúrgicos ainda no ventre da mãe. Na neonatologia, contudo, a tecnologia anda de mãos dadas com a delicadeza do contato materno e, em menor grau, também do paterno. Valoriza-se tanto o uso de cateteres, sondas e eletrodos, garantia de bom funcionamento das funções vitais, quanto o colo dos pais e uma UTI com iluminação reduzida de modo a acalmar os pequenos pacientes.

Fonte: 

segunda-feira, 23 de abril de 2012

A vida secreta das mães de UTIs

Bebês com baixo peso e altos custos com internamento estão entre os efeitos da taxa crescente de crianças nascidas antes da hora no Brasil
Enquanto a taxa de natalidade cai ano a ano, a proporção de bebês nascidos antes da hora só aumenta no Brasil. De 2001 a 2010, o número absoluto de nascimentos teve queda de 8,2%, passando de 3,1 milhões para 2,8 milhões. No mesmo período, o porcentual de prematuros foi de 6,3% para 7,1% do total – o equivalente a quase 205 mil bebês em 2010, na sua maioria com baixo peso e outras complicações. Além dos problemas de saúde que obrigam as crianças a ficar meses internadas, as famílias enfrentam o desgaste emocional e os altos custos dos tratamentos.
O Ministério da Saúde não tem dados de quanto custa tratar um bebê prematuro, mas informa que paga ao menos R$ 478,72 por uma diária em UTI. Esse valor pode ser multiplicado por quase dez se forem computados outros gastos, como medicamentos e alimentação especial. Segundo maternidades de Curitiba, uma diária pode chegar a R$ 4 mil, dependendo do grau de comprometimento do recém-nascido.
De acordo com o Ministério da Saúde, não existem no Brasil estudos que determinem as causas para o crescimento da prematuridade. Mas fatores como a preferência pela cesariana, o crescimento das gestações múltiplas e o adiamento da maternidade estão entre as possíveis explicações.
O Brasil tem uma das maiores taxas de cesáreas do mundo. 45% dos partos são cirúrgicos, enquanto a Organização Mundial da Saúde estabelece o limite de 15%. O quadro piora quando se considera gestantes com melhores condições financeiras: entre as que têm plano de saúde, a proporção de cesarianas sobe para 90%. “Quando é programada com semanas de antecedência, a cesariana pode aumentar a chance de nascimento prematuro. Há casos de indicação médica para esse tipo de procedimento, mas nos demais o ideal é o parto normal, que desencadeia uma série de alterações hormonais necessárias à preparação da criança para o parto”, explica o médico Nelson Arns, doutor em Saúde Pública.

Gestações múltiplas
O porcentual de gestações múltiplas cresceu 17% no país em sete anos. Segundo a Pes­­­­­quisa Registro Civil 2010, do IBGE, a proporção de brasilei­ros nascidos nesse tipo de parto passou de 1,59% para 1,86% do total entre 2003 e 2010, o que significa que apenas em 2010 nasceram cerca de 50 mil gêmeos, trigêmeos e quadrigêmeos (3 mil no Paraná).
A ginecologista Francieli Maria Vigo, pós-graduanda em Reprodução pela Universidade Federal de São Paulo, diz que as chances de parto prematuro são três ou quatro vezes maiores em gestações múltiplas. “Depende do número de fetos e das condições de saúde da mãe. Quanto mais bebês e quanto mais delicado o quadro da mãe, maiores as chances de parto prematuro.”
Nelson Arns, coordenador nacional da Pastoral da Criança, destaca também a idade materna como outro fator importante. “Um estudo feito na Dinamarca comprovou que o risco de parto prematuro é maior entre mães muito jovens e entre as que optam por ter filho mais tarde.”
Para ele, no caso das mães mais jovens pesa o fator econômico. “Geralmente meninas pobres têm filhos antes da hora. Elas não têm acesso ao pré-natal de qualidade e não previnem ou tratam doenças, como a infecção urinária, que antecipam o nascimento do bebê.” Com relação às mães mais maduras, ele acha que elas precisariam ser devidamente informadas que estão mais sujeitas ao parto prematuro e a todas as consequências dessa escolha.
Nelson Arns alerta ainda para o fato de muitas mulheres deixarem de fazer exames de sangue durante a gestação, mas não abrirem mão da ecografia. “No Brasil se faz mais ecografia do que exame de sangue. Esse comportamento precisa mudar, pois a primeira serve apenas para satisfazer uma curiosidade sobre o sexo do bebê, enquanto os exames de sangue podem identificar e ajudar no tratamento de várias doenças.”

Boom de gestação de gêmeos pode ser freado no país
A preocupação com o avanço das gestações múltiplas é mundial. E como há a associação direta entre o maior número de partos gemelares e as técnicas de reprodução assistida, alguns países estabeleceram regras rígidas para os processos de fertilização in vitro.
É o caso da Finlândia, que só faz o implante de um embrião por procedimento. Lá os tratamentos são patrocinados pelo governo, que prefere pagar os custos de várias tentativas para uma mulher engravidar do que arcar com os efeitos indesejados de gestações múltiplas, especialmente o nascimento de prematuros.
“No Brasil não temos mais do que cinco centros públicos de reprodução assistida. Eles não respondem nem por 5% dos procedimentos realizados todos os anos, que giram na casa dos 50 ou 60 mil. E como os custos são altos – uma fertilização in vitro pode chegar a R$ 18 mil –, os casais buscam maiores chances de sucesso e optam pela implantação de mais de um embrião”, explica o presidente da Sociedade Brasileira de Reprodução Assistida, Adelino Amaral.
Mas aqui as regras também estão se tornando mais rígidas e há a expectativa de que nos próximos anos o país reverta a tendência de elevação das gestações múltiplas, como reflexo da resolução 1.957/2010, do Conselho Federal de Medicina (CFM). Ela limita o número de embriões implantados por procedimento: dois para mulheres com menos de 35 anos; três, para quem tem até 40 anos; e no máximo quatro para quem é mais velha. Antes da mudança, mulheres com qualquer idade podiam receber até quatro embriões.

Múltiplos
Os números do IBGE mostram que o crescimento nas gestações múltiplas se concentra nos casos de gêmeos. Mas, mesmo sendo possível para mulheres de qualquer idade implantar ao menos dois embriões, o médico Renato Fraietta, coordenador do Centro de Reprodução Assistida da Universidade Federal de São Paulo, diz que a resolução do CFM vai impactar nas gestações de gêmeos. “Quando implantamos quatro embriões, dificilmente todos se desenvolvem. Agora, com dois embriões, ainda teremos gêmeos, mas será mais comum o desenvolvimento de apenas um bebê.”
Já há relatos de queda nos casos de gestações gemelares, pois, antes mesmo da resolução do CFM, os médicos sentiram a necessidade de reduzir o número de embriões implantados. “O médico tem conhecimento de todas as complicações dos partos múltiplos e o dever de orientar o casal. É bonito ver dois, três ou até quatro bebês juntos, mas há muitas implicações que precisam ser consideradas”, diz o obstetra Hélcio Bertozzi Soares, da Câmara Técnica de Reprodução Assistida do Conselho Regional de Medicina.

Fonte: http://www.gazetadopovo.com.br/vidaecidadania/conteudo.phtml?tl=1&id=1246951&tit=A-vida-secreta-das-maes-de-UTIs